quarta-feira, dezembro 17, 2003

Um Presente de Natal

Tive hoje, oficialmente, a confirmação de que fui aceito para o Doutorado em Direito Internacional na USP. Desde setembro que estou fazendo prova atrás de prova, preparando projeto de pesquisa e lendo, lendo muito para isso e hoje, depois de um suspense de mais de uma semana, saiu o resultado: aprovado! Com isso este blog vai certamente acabar sofrendo de períodos mais ou menos frequentes de abandono e desamparo, pois os próximos três anos prometem ser uma loucura.

Mas hão de ser anos muito bons, e tenho muitos planos para eles, e não só no que toca aos estudos!

terça-feira, dezembro 16, 2003

Revendo o Blog

Hoje, conferindo no número de acessos ao Maisde80K (Nossa! Mais de 200 em menos de um mês! Parece que funcionou a estratégia de mandar um email para 50 pessoas avisando do lançamento do site hehehe) notei que esse blog parece ter sido feito apenas para quem me conhece: ele não diz quem eu sou, porque escrevo, de tal sorte que, se um desavisado pesquisar no Google por um site que contenha as palavras Stanislaw Ponte Preta, Maria Rita e Richard Bachman (por que raios alguém procuraria por tal combinação de personalidades?), ele daria com um blog praticamente anônimo... Blogueiro de primeira viagem tem dessas coisas, mas prometo que vou dar uma garibada no template ainda hoje!

segunda-feira, dezembro 08, 2003

De tirar o chapéu... ou a Cartola.

(antes que alguém tire conclusões apressadas, esse segundo post sobre música não quer dizer que o meu blog só tratará desse assunto. É pura coincidência, ou então sinal de que ando prestando mais atenção nisso ultimamente...)

No quesito música, sou um cara bem eclético. Uma vasculhada nos CDs que levo no carro para me distrair nas incontáveis viagens São Paulo-Sorocaba-São Paulo pode revelar supresas, como dois títulos dos Racionais MCs (o Sobrevivendo no Inferno - o melhor disco deles, IMNSHO - e o Nada Como Um Dia Após o Outro Dia), dividindo o espaço com o Winelight do Grover Washington Jr., enquanto no player está tocando a trilha do Sociedade do Anel... Tirando os breganejos (Daniel, Leonardo e o diabo a quatro) e os grupos de pagode e axé, minha CDteca aceita qualquer coisa, de MPB ao punk, do clássico à disco.

Ultimamente, porém, tem um CD que não me sai do aparelho: o segundo álbum do Cartola, editado por uma tal de Discos Marcos Pereira, que encontrei sem querer numa baciada das Lojas Americanas por incríveis R$ 9,90.

Antes, um pouco de história: Angenor (assim mesmo, com "n") de Oliveira (11/10/1908 - 30/11/1980), nascido no Catete, mudou-se aos 11 anos para o Buraco Quente, um bairro no morro da Mangueira. Estudou pouco, completando apenas o primário, e foi trabalhar como pedreiro, onde ganhou o apelido Cartola porque sempre usava um chapéu-coco para proteger os cabelos dos respingos de cimento. Em 1928 funda com seu amigo Carlos Cachaça e outros sambistas do morro o Bloco dos Arengueiros (por causa das confusões que arrumavam), que no ano seguinte é rebatizado como Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira. Descobriu que podia ganhar dinheiro vendendo seus sambas, e forneceu muito material para Francisco Alves, Silvio Caldas, Araci de Almeida e Carmen Miranda nos anos 30. Com isso arranjou certa fama, não muita por causa do forte preconceito, mas o suficiente para que músicos de renome, como Villa Lobos, subissem o morro para conhecê-lo e aprender com ele.

Segundo reza a lenda, a morte de sua esposa Deolinda o teria feito se afastar do meio artístico - inclusive da Escola de Samba que ajudara a fundar - por mais de 10 anos. Só voltou à música quando, em 1959, o jornalista Sérgio Porto, o genial Stanislaw Ponte Preta, depois de muito procurá-lo, encontrou-o em Ipanema trabalhando como lavador de carros e vigia noturno; espantado de ver aquele talento desperdiçado, propôs-se a ajudá-lo a recomeçar a carreira, levando-o para cantar na rádio Maytink Veiga e arrumando-lhe um emprego no jornal Diário Carioca. Nessa segunda fase, já vivendo com Dona Zica, sua companheira até o final da vida, Cartola deu o grande impulso para a popularização do samba no Brasil, ao fundar o Zicartola, um restaurante/casa de shows que teve vida curta, mas que pôs a jovem bossa nova em contato com o samba do morro.

Grava seu primeiro disco em 74, com 66 anos - lançaria apenas mais três discos-solo (em 76, 77 e 79). Foi assunto de um especial da Rede Globo em 77, e o sucesso de sua participação num show com João Nogueira o leva a fazer shows em várias cidades brasileiras. Em 1978 muda-se da casa verde-e-rosa no morro da Mangueira para Jacarepaguá e, na época em que lançava seu último disco, descobriu o câncer que viria a matá-lo pouco mais de um ano depois. Nunca ficou rico com música, apesar das maravilhas que criou e que ajudaram muitos outros artistas a vender muitos discos, e no final da vida sobrevivia de um salário de contínuo no Ministério da Indústria e Comércio.

Chega de história. Quem quiser saber mais, vale checar a biografia do Cartola. É um dos livros na minha lista de "preciso ler".

Não sei sobre os outros discos (não vai demorar para comprar todos), mas neste disco Cartola é melancólico. Dá até para compará-lo com o Lupicínio Rodrigues, o rei da dor-de-cotovelo. Ele canta a saudade de um amor que não volta mais:

"Bate outra vez / Com esperanças o meu coração / Pois já vai terminando o verão / Enfim
Volto ao jardim / Com a certeza que devo chorar / Pois bem sei que não queres voltar / Para mim
Queixo-me às rosas / Que bobagem! as rosas não falam / Simplesmente as rosas exalam / O perfume que roubam de ti
Ah! Devias vir / Para ver os meus olhos tristonhos / E quem sabe sonhar o meus sonhos / Por fim"
(As Rosas não Falam)


Depois, descreve a dor do amor perdido e a esperança de que isso passará, e a inutilidade de se destruir por amor:

"Nada consigo fazer quando a saudade aperta / Foge-me a inspiração, sinto a alma deserta
Um vazio se faz em meu peito / E de fato eu sinto em meu peito um vazio
Me faltando as tuas carícias / As noites são longas e eu sinto mais frio
Procuro afogar no álcool a tua lembrança / Mas noto que é ridícula a minha vingança
Vou seguir os conselhos de amigos / E garanto que não beberei nunca mais
E com o tempo essa imensa saudade que sinto se esvai"
(Peito Vazio)


Propõe-se a perdoar, de novo, o amor que lhe abandonou:

"Tive que contar a minha vida / A esta mulher fingida / Que me faz sofrer
Essa dor que tanto me crucia / Roubou toda a alegria / Do meu viver
Pode ser que ela ouvindo os meus ais / Volte ao lar para viver em paz
Esta malvada nem sabe o mal que fez / Mas não faz mal eu lhe perdôo outra vez
O meu coração vive reclamando noite e dia / Por isso eu peço que ela volte para a minha companhia"
(Não Posso Viver sem Ela)


Alerta (amaldiçoa?) uma mulher que está a deixá-lo (não consigo me decidir se essa mulher seria uma namorada ou uma filha):

"Ainda é cedo, amor / Mal começaste a conhecer a vida / Já anuncias a hora de partida / Sem saber bem o rumo que irás tomar
Preste atenção, querida / Embora eu saiba que estás resolvida / Em cada esquina cai um pouco a tua vida / Em pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-me bem, amor / Preste atenção, o mundo é um moinho / Vai triturar seus sonhos tão mesquinhos / Vai reduzir as ilusões a pó
Preste atenção, querida / De cada amor tu herdarás só o cinismo / Quando notares estás à beira do abismo / Abismo que cavaste com seus pés"
(O Mundo é um Moinho)


E depois descreve a expectativa do reencontro com um amor antigo:

"Ah! Essas cordas de aço / Esse minúsculo braço / Do violão que os dedos meus acariciam
Ah! Esse bojo perfeito / Que trago junto ao meu peito / Só você, violão, compreende porque perdi toda a alegria
E no entanto, meu pinho / Pode crer, eu adivinho / Aquela mulher até hoje está nos esperando
Solte seu som da madeira / Eu, você e a companheira, à madrugada iremos para casa cantando!"
(Cordas de Aço)


E finalmente canta - não sem certo exagero - sua maior paixão, a Mangueira, que é identificada com o próprio Morro.

"Habitada por gente simples e tão pobre / Que só tem o Sol que a todos cobre / Como podes, Mangueira, cantar?
Pois então saiba que não desejamos mais nada / À noite, a lua prateada, silenciosa, ouve nossas canções
Tem lá no alto um cruzeiro onde fazemos nossas orações / E temos orgulho de ser os primeiros campeões
Eu digo e afimo que a felicidade aqui mora / E as outras escolas até choram invejando a sua posição
Minha Mangueira, és a sala de recepção, Aqui se abraça inimigo como se fosse irmão"
(Sala de Recepção)


Reparem no uso do português, no vocabulário, na simbologia que ele usa para descrever emoções. A tirada das rosas, a comparação do violão com o corpo da mulher, do mundo com uma mó, são todas figuras ricas, para mim tão bonitas quanto a do chão de estrelas, de Silvio Caldas e Orestes Barbosa (gravada pelo Silvio, pelo Nelson Gonçalves, pela Elizeth Cardoso e - pasmem - pelos Mutantes!). Junte a melodia - violão, cavaco e flauta, na maioria das vezes - e a voz calma e tranquila do Cartola, e têm-se canções que se pode dizer perfeitas.

Canções, perfeitas, feitas por alguém que estudou apenas até a quarta série, ganhou a vida como pedreiro, lavador de carros e vigia noturno. Tudo bem que na época o português era muito melhor falado do que é hoje, mas isso não consegue, por si só, explicar como canções desse tipo, de tamanha sensibilidade e qualidade, surgiram numa favela no Rio. A genialidade, parece, desafia explicação. O que me leva a duas conclusões, uma a base da outra:

1) Sensibilidade e talento não escolhem lugar ou classe social para aquinhoar determinadas pessoas, donde...
2) O Brasil deve estar perdendo milhares de talentos (talvez alguns até do porte de um Cartola) por permitir a marginalização e exclusão de uma imensurável multidão de pessoas em favelas, periferias, penitenciárias etc.

Ouvir um disco do Cartola, hoje, e refletir sobre não apenas a música maravilhosa mas também as circunstâncias que a geraram, deveria ser obrigatório nesses nossos tempos de "apartheid" social, em que nossas cidades estão claramente sendo divididas em dois mundos estanques, incomunicáveis, em que as crianças nascidas em famílias de classe média ou acima estão sendo ensinadas a ver as de classe pobre e miserável como ameaças, em que estamos condenando quem não pode pagar por ensino de qualidade a não ter como aprender o necessário para seu completo desenvolvimento a não ser com extraordinário esforço e, o mais grave no meu ver (e que será objeto de um próximo post), em que a maioria da população prefere esquecer as suas responsabilidades (que não são apenas do Governo) pela criação de uma enorme massa de crianças e adolescentes não-inseridos na sociedade - para quem as desvantagens da inclusão social como trabalhador honesto remunerado com salário-mínimo são infinitamente piores do que a sua "exclusão" através da participação na criminalidade organizada, aí incluído o custo da grande probabilidade de morte prematura - e advogar pela segregação, desta feita penal, daqueles que já nasceram e cresceram segregados, pela simples e monstruosa falha de toda a sociedade em lhes dar uma melhor perspectiva de vida.

Sobre Cartola, Nelson Sargento (outro papa do samba de raiz) disse: "Cartola não existiu. Foi um sonho que tivemos." Tendo ouvido apenas um álbum gravado por Cartola, eu acho fácil concordar com ele. Infelizmente, do jeito que as coisas vão, é um sonho que acho que dificilmente sonharemos novamente...

No final das contas, o mundo é realmente um moinho, mas no Brasil de hoje ele não tritura apenas sonhos e ilusões, mas também pessoas.


terça-feira, dezembro 02, 2003

Objeto do Desejo

IE

Um box de madeira, 14 DVDs, e as três primeiras temporadas da mais genial série de animação da história da TV. A
Coleção Premium dos Simpsons está em pré-venda no Submarino, por 460 reais.

Se Papai Noel estiver lendo esse post, pode incluir na lista :-) Eu fui um bom menino este ano, juro!

segunda-feira, dezembro 01, 2003

Maria Rita

No final dos anos 70, o já consagrado Stephen King, autor de Carrie e O Iluminado, entre dezenas de outras histórias menores, resolveu testar sua própria capacidade de atrair público para suas histórias. Talvez questionando se seus livros eram tão bons quanto os milhões de leitores o sugeriam, ou se as vendas deviam-se principalmente ao fato de a capa de suas obras estampar "Do Mesmo Autor de Carrie" ou "Do Mesmo Autor de O Iluminado", o Mestre do Horror resolveu publicar alguns livros sob o pseudônimo de Richard Bachman. Rage, de 1977, The Long Walk, de 1979, Roadwork, de 1981, The Running Man, de 1982, e Thinner, de 1984, não encontraram nas livrarias uma recepção calorosa como as outras obras assinadas pelo autor. Ficaram longe das listas de mais vendidos, foram lidas por pouquí­ssima gente, e ninguém cogitou levá-las para o cinema. Em 1984, Steve Brown, empregado duma livraria de Washington, encasquetou que um era o outro e foi atrás de provas de sua suspeita, encontrando, nos arquivos da Biblioteca do Congresso, antigos registros de copyright dos textos de Bachman em nome de King. Com a publicação de um artigo sobre o episódio no Washington Post, terminara a experiência Richard Bachman; todavia, o grande público americano e mundial descobriu, de uma hora para outra, que existiam 5 obras de seu autor de horror favorito que ainda não haviam sido lidas. As quatro primeiras histórias foram reunidas numa coletânea - que foi sucesso de vendas - e a quinta se tornou um romance de sucesso, listado entre os mais vendidos nos EUA. Posteriormente, em 1987, The Running Man virou filme, estrelado pelo atual Governator Arnold Schwarzenegger.

O que nos diz esse relato? Lançados sob um pseudônimo desconhecido, os livros de Bachman naufragaram nas livrarias. Uma vez descoberta a verdadeira identidade do autor, viraram best-sellers, como tudo o que o King fazia e faz até hoje. Se a experiência significa alguma coisa, é provar que o nome do King, sozinho, é capaz de fazer um livro se tornar campeão de vendas. Mas será essa a única conclusão que se pode tirar disso? Eu li todos os livros de Bachman e gostei muito de todos; The Long Walk é excelente, The Running Man é infinitamente melhor do que o filme e o Thinner (traduzido como A Maldição do Cigano) é um livro eletrizante. Que meu gosto não seja o padrão mundial de qualidade literária, vá lá, mas certamente esses textos não eram porcarias insalváveis. Ainda assim eles encalharam desde o lançamento e venderam horrores quando se descobriu quem era o autor verdadeiro...

A questão que se coloca é: o que faz de um produto - um livro, no caso, um sucesso? Minha teoria (e eu não conheço nada de marketing ou publicidade) é que um livro faz sucesso quando ele parece valer a pena o tempo que vamos gastar lendo-o. Isso não significa que ele vá realmente valer a pena, pois é uma impressão prospectiva, feita em relação a um evento futuro. Se ela se comprova, ficamos satisfeitos e, eventualmente, queremos mais; se não, podemos até terminar o livro por desencargo de consciência ou curiosidade, ou então largá-lo sem terminar, mas já teremos comprado o livro, que é o que conta para a editora. Qualquer que seja, pois, a nossa opinião real sobre o livro, ela não influirá na decisão de compra, que é feita sobre uma expectativa. Pode, todavia, influir sobre a decisão de compra de outras pessoas, na medida em que propagamos nossa opinião para outros potenciais compradores do livro e afetamos sua decisão de compra.

Quando os livros de Bachman foram lançados, eles não tinham nenhum meio de fazer os leitores acharem que seu tempo seria melhor gasto com eles do que com outros livros, e por isso mesmo não venderam muito. Quando se descobriu o nome verdadeiro do seu autor, esse instrumento surgiu: "o King é o Rei do Horror", "todo livro do King é best seller" etc., essas concepções prévias sobre a obra do King fizeram com que esses livros, de uma hora para a outra parecessem que sua leitura valia a pena e por isso mesmo estouraram nas vendas. A sua qualidade intrínseca, porém, não mudou; eles continuaram sendo os mesmos livros de sempre, bons livros, na minha não tão modesta opinião. Mas parte da crítica os rebaixou justamente por terem vendido apenas por terem estampado o nome de Stephen King.

Corte para o Brasil em 2003. 21 anos após a perda de uma de suas maiores cantoras, que deixou um vazio que ainda não foi devidamente preenchido, eis que a sua filha resolve se lançar na carreira de cantora, revivendo, por um daqueles milagres da genética que o homem tanto se esforça para entender e reproduzir, a voz e os trejeitos da mãe de tal forma que, para os que a viram nas primeiras vezes, seu ato se assemelhava a uma sessão espírita. Menina bonita, se bem que longe dos atuais padrões atléticos e/ou bulímicos de beleza feminina, voz poderosa e bem trabalhada, repertório escolhido a dedo, misturando música de festa com climas intimistas (e, em cada canção, uma reflexão ora mais ora menos explícita sobre a sua situação de filha/irmã gêmea de mito), Maria Rita encanta.

Fui ver seu espetáculo no DirecTV Music Hall, falecido Palace, em Moema, ontem de noite. Três musicos e um performer (o fantástico percussionista Da Lua, um show a parte) a acompanhá-la, cenário e iluminação simples, até óbvios.

Casa lotada.

Não, lotada é pouco. Ingressos esgotados há mais de semana, gente na porta perguntando quem tinha ingresso extra para vender, o show de Maria Rita, mais do que uma apresentação ao vivo de uma boa cantora, é um happening. Lá dentro, histeria completa. Palmas efusivas quando ela entra no palco, tímida, descalça. Canta três músicas antes de falar com a platéia e parece divertir-se com o papel de Mestre de Cerimônias, pela primeira vez no comando de uma massa de pessoas. Alguns espectadores mais empolgados gritam elogios, gente assovia, flashes espocam a toda hora apesar da proibição de câmeras no recinto. Atrás de mim, algumas mulheres esforçavam-se para acompanhar Maria Rita em todas as músicas, o que fazia eu ter de me concentrar para ouvir a voz da cantora e não as delas para satisfazer a minha curiosidade: a voz dela é mesmo igual à da Elis?

Tinha 8 anos e passava férias em Itanhaém, se nao me falha a memória, quando a Elis morreu. Nunca a ouvi cantar ao vivo e pouco ouvi de suas músicas (Águas de Março, O Bêbado e o Equilibrista e Dois Para Lá, Dois Para Cá são algumas das poucas que me lembro dela) mas a sua voz, ainda que gravada, é marcante. E a da filha soa igual, o que, somado a algumas expressões do andar e do dançar, realmente materializa no palco a memória que se tem dela. Às vezes, a coisa arrepia.

Para mim, que mal ouvi no rádio (ouço basicamente CBN no carro) A Festa, nunca ouvi seu CD e nem vi seu DVD, e fui ao show apenas porque ela é "A filha da Elis", era o que eu queira ver. Surpreendi-me, além disso, com uma boa cantora, um repertório legal (mas que eu não ouviria repetidamente), que parece ter um grande futuro pela frente. Da mãe, mesmo, só faltou o extremo sentimento que todos dizem que ela transmitia no palco, ao interpretar e não apenas cantar as músicas. Maria Rita tem muita técnica, e por vezes até deixa passar um sentimento na canção, mas têm-se a impressão permanente de que ela está fazendo tudo o que foi ensaiado, direitinho, sem permitir que o improviso deixe aparecer a sua inexperiência.

Para quase todo o resto do público, todavia, isso deve ter passado despercebido. O que se via era uma celebração total. Marisa Monte demorou anos para dominar de maneira tão absoluta um público; outras ótimas cantoras, como Mônica Salmaso, Ana Carolina, para citar só quem eu me lembro de cabeça, até hoje lutam sem consegui-lo; uma infinidade de outras ótimas cantoras nem público têm, além dos frequentadores dos bares onde cantam... Maria Rita, contudo, nem bem lançou o primeiro CD (o segundo está no forno, pelo que ela disse no show), tem no currículo uma participação num show do Milton Nascimento (no qual dividiu o palco com uma cantora que dizem ser mais talentosa do que ela, mas que ainda é desconhecida, inclusive por mim...) e em shows esporádicos no Supremo Musical em SP, já comanda multidões. Recepção do público como essa eu só tinha visto nas peças da Marília Pêra, que tem décadas de estrada construindo sua reputação e dando inúmeras razões para o público aplaudí-la de pé - algo que no Brasil virou praxe nas nossas platéias servis que a todos aplaudem de pé, talvez por educação... Maria Rita, ainda que cantasse Parabéns a Você, seria aplaudida de pé. Ela já tinha ganho os aplausos antes mesmo de cantar.

O que me traz de volta aos livros do Richard Bachman. O que faz um livro, ou uma cantora, se tornar um sucesso? É a qualidade intrínseca do que ele (ou ela) é, ou aquilo que esperamos que ele (ou ela) seja? Mais do que isso, será que aquilo que esperamos que o livro (ou a cantora) seja afeta o que nos pensamos a repeito dele (ou dela)? Será que ler um livro do Richard Bachman antes de saber que ele é o Stephen King nos fará julgá-lo diferentemente de lê-lo após a descoberta? Será que as pessoas que se esgoelavam no show, algumas até histéricas, se tivessem recebido uma fita demo de uma tal Maria Rita, desconhecida e filha de Maria Ninguém, teriam a mesma reação que tiveram ao ouvi-la sabendo-a filha de Maria Alguém?

Infelizmente, de velhos sabemos que experiências socias não podem ser realizadas em laboratório, logo nos resta tentar interpretar o que ocorre, e imaginar possíveis cenários para interpretá-los depois. A verdade, infelizmente, nós nunca saberemos... E nem a Maria Rita, que diz que luta para se desvencilhar da imagem da mãe mas a cita repetidamente no palco, em fala e em canção e em expressão corporal. Talvez ela tenha um dia que gravar um Cd só com versões de clássicos da Elis, para que depois passem a ouvi-la como Maria Rita e não como Maria filha de Maria Alguém... Enquanto isso, seus CDs vão vender, seus DVDs vão vender, suas entrevistas vão ser disputadas a tapa, mas a gente nunca saberá por completo porque que eles vendem.


Em Tempo: As explicações do próprio S.King para a criação de R.Bachman não batem exatamente com a minha, mas também não batem umas com as outras... No seu site oficial, na seção FAQ, ele diz que teria criado o pseudônimo para poder burlar a regra do "1 livro por ano apenas"; já no segundo prefácio à coletânea Bachman Books, publicada num fansite, ele afirma que R.Bachman foi um meio de encontrar um ponto de vista e uma voz um pouco diferente da dele ao escrever. Depois de descoberto, King usou a experiência de ter um pseudônimo como material para escrever The Dark Half, na qual o alter-ego de um escritor toma vida e começa a matar e a pôr em risco a própria vida do seu "criador" - um bom livro de horror, por sinal, que virou um filme mediano, com o Timothy Hutton no papel principal, dirigido pelo lendário George Romero.

Começando

Faz tempo que eu venho procurando um jeito mais eficiente de me comunicar com meus amigos e com qualquer um com tempo livre e disposição para ouvir/ler o que um desconhecido tem a dizer acerca da vida e das coisas que ocorrem todo o dia e que, no conjunto de como as percebemos, formam a tal da nossa vida - no caso, a minha vida.

Já tentei listas de discussão, mas a exigência de se manter as mensagens in topic sempre limitava os assuntos sobre os quais que eu podia escrever...

Já tentei e-mails coletivos, mas a seleção dos destinatários de cada mensagem era um problema: se eu colocasse todos os meus contatos (ô jargão de usuário da Micro$oft...) como destinatários, nem todos provavelmente gostariam de recebr a mensagem; se eu selecionasse apenas aqueles que eu acreditava que se interessariam, eu corria o risco de deixar outros de fora por ignorância (além de que alguns dos que eu achava que gostariam de receber minhas mensagens podiam não querê-las).

Tentei também um wiki, mas a coisa não foi para a frente, uma por minha falta de tempo para escrever, outra porque eu acabei não gostando do formato (para esse fim específico) depois que o conheci mais a fundo.

Dos blogs eu sempre tive receio, até em razão da tendência que temos de transformá-los em diários extremamente pessoais e que acabam divulgando coisas que não gostaríamos (conscientemente) que se tornassem públicas. Por outro lado, eles não se prestam bem à troca de mensagens, mas apenas à transmissão de mensagens num único sentido, o do dono do blog para os seus potenciais leitores. Não era bem isso o que eu estava procurando, mas pode ser um começo, até porque conto com meus amigos htmleiros para implementar algumas cositas que tenho em mente para este espaço.

É isso. Este blog começa, oficialmente, com as minhas impressões sobre o show da Maria Rita, que assisti ontem no DirecTV Music Hall.

Bem vindos!

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